Wattpad – conheça plataforma moderna para rota de leitura

A instabilidade do mercado editorial e os baixos índices de leitura deram ao Brasil o estigma de um país que não lê. Mas a internet pode apontar outros caminhos e novas possibilidades. Uma das rotas modernas passa pelo Wattpad, um aplicativo que permite escrita, publicação e compartilhamento de histórias com outras pessoas. Estima-se que essa plataforma criada no Canadá em 2006 conecta atualmente 90 milhões de pessoas ao redor do mundo. O impacto dos aplicativos e redes sociais na formação de leitores e escritores está nas novas interações do leitor com a produção literária.
A escritora e jornalista Bruna Torres é um exemplo de jovem que teve sua paixão por leitura influenciada pela internet – Foto: Alex Régis

 

O Wattpad pode ser usado por meio do site, computador ou app no celular, incentivando os usuários a criar e compartilhar suas próprias histórias em qualquer gênero que desejar. A plataforma oferece uma variedade de recursos para categorizar suas histórias e diferentes tipos de conteúdo, o que ajuda os usuários a evitar conteúdo impróprio ou encontrar o tipo exato de tópico que desejam ler e escrever.
Pessoas jovens são a maior parte dos usuários do Wattpad. O reflexo disso no atual perfil de consumidores é nítido. O 11º Painel do Varejo de Livros no Brasil, divulgado pelo Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL), mostrou que as vendas do setor cresceram 33,03% em volume, e 31,14% em valor no acumulado de janeiro a novembro de 2021. De acordo com o estudo, crianças e adolescentes concentram as maiores proporções de leitores na população.
A escritora e jornalista Bruna Torres é um exemplo de jovem que teve sua paixão por leitura diretamente influenciada pela internet. Hoje com 27 anos, ela conheceu o Wattpad aos 17, quando estava no ensino médio. Começou lendo e depois escrevendo. Graças à plataforma, lançou um livro físico, o romance “James”, assinou contrato para outro livro (“A filha rebelde do pastor”), tem conto publicado na Amazon (“Fake love”), e possui mais de 500 mil leituras no site – além de sete livros completos.
Foi em 2017 que Bruna viu sua experiência de leitora on-line ganhar outra dimensão. “Escrevi uma coisa bem clichê, um romance entre um cantor famoso que tinha uma vida dupla e uma garota do interior. A partir desse livro, fui aprendendo diversas habilidades, como divulgar meu livro nas redes sociais”, conta. Mas foi a interação com os leitores o que mais a fascinou nesse processo.
“Quando comecei a receber críticas e elogios na plataforma, foi me motivando a aprimorar a escrita, as histórias, as capas. No Wattpad tudo é sobre tentativas. Você mesmo pode criar suas capas, divulgar seu trabalho, escrever, revisar. Os autores começam como um faz-tudo de seu próprio trabalho”, diz.
Seu primeiro livro, “James”, foi escrito durante a pandemia. Ela foi incentivada pelo seu grupo de leitura no Whatsapp a procurar editora carioca Sinna e oferecer o livro.  “Entre uma conversa e outra, a editora entrou em contato comigo, e de forma despretensiosa quis analisar meu trabalho. Alguns meses depois, me mandou um e-mail para publicarmos sem custos. Parecia que eu estava vivendo um sonho”, conta.
Fanfics
Quem não é íntimo desse universo ainda pode vê-lo com preconceito, principalmente no que se refere às ‘fanfics’, ou seja,  textos de fãs baseados em personagens, filmes, séries, etc. Elas são a base de redes como o Wattpad, mas muitos ainda não as vêem como literatura “de verdade” – até mesmo na própria comunidade.
“Algumas fanfics são escritas sobre temáticas já existentes, mas isso não diminui seu valor.  Acho que todo começo precisa de um ponto de partida, se as pessoas se sentem bem escrevendo sobre personagens que gostam, não vejo problema em fazer disso o começo para uma trajetória”, diz a jornalista.
Se os jovens são os que mais lêem no Brasil atualmente, Bruna acredita que a internet funciona como um farol editorial para o mercado.  “É um espaço no qual editoras e agentes literários podem ficar à espreita, caçando novos talentos, vendo como os leitores interagem com aquele conteúdo”, analisa. Ela acredita que o mercado de livros digitais mudou a percepção sobre publicações.
“Não basta apenas pagar para publicar um livro e o sucesso vai vir. As editoras se atentam bastante ao público alvo dos autores, das movimentações nas redes sociais e interações com os conteúdos. Hoje os autores independentes precisam saber de tudo um pouco. Marketing, edição de textos, de vídeos, aprender a ser visto para ser lembrado”, explica.
Os milhões de leitores que o Wattpad possui, incluindo no Brasil, fazem Bruna pensar que os hábitos de leitura do brasileiro vão além da visão tradicional sobre o assunto. “Há muito preconceito com livros digitais, fanfics, e-book, etc., mas há diversas plataformas que tornam a leitura algo mais acessível e democrático. Mas às vezes esse universo tão singular passa despercebido por aqueles que se limitam a não explorar as diversas possibilidades que a tecnologia agrega”, afirma.
Feedback instantâneo
Para a escritora, a internet quebrou definitivamente as barreiras entre leitura física e digital. “A internet rompeu esse tradicionalismo quando faz os leitores terem interações diretas com os autores. É um feedback instantâneo, leitores e escritores  criaram uma rede de afinidade que sem a internet não seria possível. Estamos longe, mas ao mesmo tempo tão conectados, acho que é isso que torna os livros digitais e plataformas tão atraentes para os jovens, a sensação de proximidade, de ser espelhado em algum personagem e pensar ‘ei, esse livro parece que foi escrito pra mim!’”.
Bruna afirma não concordar com o sendo comum de que “brasileiro não gosta de ler”. “Estamos lendo o tempo todo. Notícias, blogs, fofocas, lendo legendas de vídeos curtos em redes sociais. O problema mesmo é a falta de hábito de leitura, de entender que livros também são uma forma de recreação, de lazer. O caminho é encontrar um segmento que se adeque a cada gosto. A leitura aprimora o conhecimento de mundo, nos faz viajar por roteiros que muitas vezes estão na palma da mão, de um tablet, de um celular, basta apenas darmos o primeiro passo, ou neste caso, um clique”, diz.
A estudante Stephanie Xavier, 22 anos, descobriu o Wattpad aos 11, e viu seu mundo literário se expandir e ficar completo. “Durante muito tempo eu só lia dois livros na vida: ‘O pequeno príncipe’ e ‘A menina que roubava livros’. Li e reli a ponto de criar novas histórias a partir deles”, conta. Até que ganhou um tablet para estudar, e entre pesquisas descobriu o Wattpad. “Eu me apaixonei por aquela infinidade de livros virtuais pra ler”.
Foram anos de Wattpad, até que os pais de Stephanie, vendo o amor da filha pela leitura, passaram a lhe dar mais livros físicos. Hoje ela lê de (quase) tudo, e em todas as mídias, sem detrimento de nenhuma. “Livro no Brasil infelizmente é caro, mas estou frequentando mais sebos. Leio os físicos, os digitais, leio de tudo. Pra mim, basta ser interessante. A leitura pra mim é hobby e também uma válvula de escape”, conclui.
Fonte: Tribuna do Norte – por Tádzio França